Capítulo II – Duas mulheres e um bardo
Valkaria, Deheon. Capital do Reinado, moradia do Imperador-Rei Thormy, centro das decisões mais importantes que afetam todo continente artoniano, mas mais que isso, Valkaria é também uma cidade de aventureiros. Dos mais diferentes grupos, uns especializados em matar trolls, outros simples caçadores de recompensas e, claro, os tradicionais dungeon crawlers, os exploradores de masmorras. Não importando a origem ou destino, todos procuravam tavernas para relaxarem após um árduo dia ou então estalagens onde pudessem descansar em camas macias antes de abastecerem-se de mantimentos e partirem para a cidade seguinte.
Dentre os inúmeros estabelecimentos que forneciam cerveja em canecas limpas em Valkaria, a taverna da Gansa Mansa destacava-se por ter como aventureiros a grande maioria de seus freqüentadores. Plebeus eram raros e aqueles que ainda insistiam em passar uma noite lá acabavam espantados pelo ambiente mais rude e inóspito, fértil apenas em brigas, já que sempre clérigos de divindades rivais, caçador de recompensas e seu alvo, ou simplesmente desafetos antigos, acabavam se encontrando e aí a briga era certa. Ruud Thenky, o proprietário, já havia se acostumado com esses incidentes e nunca se preocupara em contratar seguranças. Estabelecia apenas uma regra: os responsáveis pela briga também deviam ser responsáveis pelos estragos por ela causados, o que queria dizer que qualquer mesa, cadeira, copos quebrados, seriam cobrados, além de, em caso de lutas mortais, ser responsabilidade do sobrevivente dar um destino ao cadáver. Se algum engraçadinho acabasse querendo fugir da regra, bem, sempre havia inúmeros outros fregueses a fim darem um fim em qualquer um que estivesse causando problemas em demasia.
A noite estava mais fria que o usual, um nevoeiro mantinha as ruas quase desertas e os copos sempre cheios. Sobre um pequeno palco feito de antigas caixas de grãos justapostas, um bardo finalizava sua apresentação dedilhando as últimas notas no bandolim de uma beleza invejável, acompanhadas de uma última e afinada frase. Os poucos que realmente ouviam a música aplaudiram e o artista retribuiu com uma mesura, retirando o chapéu adornado por uma grande pluma branca. Pouco importava que quase ninguém realmente prestasse atenção, pois o dinheiro seria pago de toda maneira.
— E então mulheres da minha vida, o que acharam da apresentação de hoje? – sentava-se a uma mesa, colocando o chapéu sobre ela, dirigindo-se a duas belas jovens. Uma com cabelos castanhos ondulados, caindo-lhe pelos ombros de forma rústica, a pele ligeiramente morena, olhos ferinos e lábios generosos, dotada de uma beleza selvagem. A outra apresentava feições mais delicadas, tez lívida, cabelos perfeitamente lisos e negros adornando-lhe o rosto que possuía uma pureza indecifrável, quase irreal.
— Esperava mais, Mahatan. – um traço de sarcasmo vindo da de cabelos castanhos. — Acho que quem vê uma de suas apresentações, acaba vendo todas. – e então sorriu, bebendo um gole da caneca à sua frente.
— Assim você parte meu coração, Lya querida. – sorriu, colocando uma das mechas do cabelo castanho para trás da orelha. Voltou-se para a outra. — Sarah? Não vai me dizer que concorda com Lya, vai? – uma esperança pueril em sua voz, fitando a garota com os olhos praticamente brilhando.
— Claro que não, Mahatan! Já disse que eu gosto muito das suas músicas... – era uma voz doce e meiga, quase inaudível devido à cacofonia do local.
Aqueles três formavam um grupo improvável, seres com visões de mundo distintas e objetivos tão diferentes que, por pouco, não eram opostos. Lya Whisper era nascida em Namalkah, uma garota com coração de guerreira, abandonou a chácara simples dos pais logo que já conseguia manejar uma espada sozinha, em busca de fama e fortuna, não importando o que tivesse que fazer para conquistá-la. Sarah MoonLight foi criada por uma sacerdotisa de Lena, que acabou por incutir na menina uma crença inabalável na vida e um asco à violência fútil e exagerada. Apesar disso, a garota refutou o ingresso ao sacerdócio por considerar o combate e a morte do inimigo como algo necessário, mesmo que como último recurso. Munida de uma boleadeira, abandonou o reino de Fortuna procurando pistas por sua família, mas somente ao encontrar Mahatan Palantir, o bardo, descobriu algo relevante: possuía uma irmã mais velha, raptada antes mesmo de ser deixada às portas do Templo de Lena. Já Mahatan nascera em uma cidade pequena do próprio reino de Deheon, filho de um casal de costureiros e talvez dono da mais incomum das histórias: não possuía (ou não havia descoberto) nenhum dom artístico até seus treze anos, sempre tendo trabalhado junto à família no ramo da tecelagem, sem a mínima ambição de rodar o mundo e conhecer novas pessoas, geralmente a maior motivação dos artistas errantes. Foi por simples acaso que, ao se apaixonar por uma camponesa vizinha e resolver compor para ela um poema, percebeu a facilidade com que as palavras vinham à mente e se juntavam, formando textos belíssimos. A partir daí, a vida do promissor alfaiate começou a desandar: Encantado com sua mais nova descoberta, mostrou-a aos pais e disse que gostaria de investir no seu talento. A família negou-lhe o sonho. E assim, o garoto que havia mudado, não suportando mais o cotidiano de tecelão, fugiu, rumando para Valkaria com apenas dezesseis anos, levando vestes feitas por ele mesmo. Com o tempo, aprendeu a tocar o bandolim e deu início à carreira artística propriamente dita. Em Ahlen, encontrou-se com uma bela moça de cabelos negros com uma história intrigante sobre uma orfandade não confirmada. Instigado por isso, resolveu acompanhá-la em sua jornada, buscando por uma verdadeira odisséia para contar ao mundo por seus versos. Lya entrou no caminho da dupla quando, passando a noite em uma estalagem, ouviu do bardo que lá se apresentava um conto sobre um artefato há muito desaparecido chamado a “Ametista do Sacrifício”. Intrigada, pediu mais informações ao artista e, no fim da conversa, acabou juntando-se a ele e a uma garota que o acompanhava, os três firmando um pacto em busca de glória, inspiração e família.
— E então meus amores, descobriram algo do nosso interesse? – era o bardo, bebendo um gole de uma taça que uma garçonete acabara de deixar sobre a mesa.
— Mahatan, o bardo aqui é você, se ainda não percebeu. – Lya, suspirando de impaciência diante daquele sorrisinho besta do homem sentado à mesa. Sarah permanecia em silêncio.
— Ah, é verdade. Desculpe-me minha cara. – riu por instantes, retomando uma fisionomia mais séria em seguida. — Vejam só... – colocou ambos os cotovelos sobre a mesa, inclinando-se em direção às ouvintes, um meio sorriso de confiança nos lábios. — ...Conversava com o velho Ruud agora mesmo e ele me disse que há pelo menos dez anos que não tem notícias da nossa querida Ametista.
— Então, por que esse sorriso? – a guerreira abanava a cabeça negativamente, parecendo questionar a si própria o porquê de estar viajando junto àquele homem.
— Ainda não terminei, docinho. Preste bem atenção, sim? Nós temos alguns fragmentos de informação sobre a família de Sarah e sobre a Ametista, não temos? – diante dos rostos confusos de suas companheiras, Palantir sorriu ainda mais, arqueando de leve as sobrancelhas, retomando a palavra em um tom paciente. — Certo, vou refrescar a memória das senhoritas: Sarinha aqui tem apenas dezessete primaveras, não é? – a garota confirmou com um abano de cabeça e o bardo prosseguiu — Também sabemos que ela possui uma irmã uns sete anos mais velha, que foi raptada com dez anos. Ou seja, faz exatamente dez anos que a mais velha das MoonLight sumiu misteriosamente, o mesmo tempo que o nosso querido taverneiro diz que não tem notícias da Ametista! Não é lindo? – e então gargalhou, recostando-se na cadeira, crente que alguma divindade maior arquitetara toda sua jornada e vida e que tudo daria perfeitamente certo.
— Você sugere que ambos os fatos tenham uma ligação direta? – era Sarah, uma voz tão baixa que parecia desculpar-se a cada palavra pronunciada. O bardo apenas fitou a garota, sem parar de exibir os dentes.
— Oras, não é óbvio? – Entretanto, ao ver que ainda não conseguira convencer as colegas, retomou o discurso. — Meus amores, minhas queridas, mulheres da minha bela vida, vejam só; Provavelmente um grupo de bandoleiros safados realizou uma onda de assaltos e seqüestros por alguns reinos e acabaram por pegar a Ametista e a irmã de Sarah, cujo nome ainda desconhecemos. O grupo provavelmente desmantelou-se em algum ponto, fazendo com que tudo se perdesse no tempo. As datas encaixam-se perfeitamente! Acreditam que isso é mera obra do acaso? Os Deuses estão mais perto de nós do que vocês podem imaginar! – E era tão enfático nas palavras, transbordava carisma e persuasão que contradizê-lo parecia um pecado. Talvez por isso que se tornara um bardo.
— Mahatan... Faz sentido. – era Lya, depois de um tempo de silêncio.
— Claro que faz sentido, docinho! Alguma vez já falei besteira para vocês? – sorria mais uma vez. Em seu canto da mesa, Sarah permanecia calada, fitando o vazio com seus olhos azuis.
***
— Eu não acredito! – bradou Lemmy, olhando para a estátua enorme da deusa Valkaria, no centro da cidade homônima. Sua voz era um misto de raiva e inconformismo. — Foi proposital, seu mago estúpido? – virava-se para Olecram, fazendo um enorme esforço para não deixar a mão escorregar naturalmente para o cabo da espada.
— Claro que sim. Você acha que Eu, o Grande Mago Senhor de Todos os Estudos Arcanos Deste e de Todos Os Planos, Olecram, erraria o alvo de uma magia de teletransporte? Francamente, Killmister... – os cabelos dele voejavam com a fria brisa noturna. O mago do grupo tinha o irritante hábito de, ao fim de uma missão bem-sucedida, levá-los não até onde era esperado e planejado, mas sim para um lugar em que, na mentalidade de Olecram, pudessem “comemorar de maneira digna o feito”.
— Você poderia, pelo menos, nos deixar em uma cidade no mesmo Reino, dá próxima vez. – era Maglor, argumentando em voz baixa, ciente de que não adiantava discutir esse tipo de coisa com o mago. O Reino em que se localizava a cidade de Valkaria era Deheon, enquanto o destino dos aventureiros era Zakharin, no Reino de Zakharov.
— Não existe cidade no Reinado que possua tavernas tão boas ou estalagens com camas tão macias como Valkaria, meu caro Maglor! – realmente, discutir com o mago era, no mínimo, ingenuidade, pois ele sempre teria uma justificativa bem humorada para tudo. Assim, o grupo já conformado (menos, talvez, Lemmy Killmister), encaminhou-se para a taverna mais próxima, uma construção de dois andares conhecida como a taverna da Gansa Mansa.
Tavernas são lugares comuns na vida de aventureiros e, naquelas acostumadas com eles como a Gansa Mansa, os diferentes grupos praticamente não chamam atenção, entrando e saindo do estabelecimento muitas vezes sem atrair um olhar sequer. Entretanto, esse não foi o caso do sexteto que acabara de chegar à cidade: logo que Didier abriu a porta, sempre empolgado com a perspectiva de ficar ébrio de vinho, e seus companheiros o seguiram, vários dos presentes levaram suas vistas até a porta, pois era um grupo grande, sem nenhuma mulher, com dois indivíduos enormes e, além de tudo, um elfo. Não bastasse isso, parecia que pelo menos metade deles estivera perto da morte há pouco: pálidos e com ferimentos bastante feios ainda sem cicatrizar completamente.
Acomodaram-se em bancos em volta do balcão, já que as demais mesas estavam todas ocupadas.
— Sua melhor de garrafa de vinho, meu bom homem. – o elfo nunca fora alguém cuja discrição fosse uma qualidade admirável, em especial quando estava prestes se embriagar.
Gradativamente, os demais clientes iam vendo que os recém-chegados não possuíam nada demais e voltavam suas atenções a outros assuntos de maior interesse. Claro que aqueles três, sentados em uma mesa próximo de onde se encontrava o elfo e seus amigos, escutavam tudo atentamente, mesmo que parecessem estarem concentrados sobre um mapa, discutindo rotas de viagem.
Uma taça, duas, três e logo se foi a garrafa, juntamente com o tempo. Grande parte da clientela já havia raleado e o trio estava prestes a perder o interesse pelos variado grupo de aventureiros, quando lá pela metade da segunda garrafa de vinho, Didier disse, distraidamente alto:
— Psiu, Maglor? Posso dar uma olhada rápida no colar?
— Eu já te disse e repito: Não. Agora, se ainda tem amor por Glórienn, feche a boca.
Na mesa próxima, os três trocaram olhares interessados, lamentando que aquele que se chamava Maglor não estivesse suficientemente alterado para mostrar o bendito colar ao elfo. Mesmo sem ter visto a tal jóia, Mahatan sorria com uma expressão de “Viram-como-tudo-se-encaixa-queridinhas?”. A probabilidade de um grupo de aventureiros desconhecido que chegava à taverna da Gansa Mansa em Valkaria possuir um colar que tenha algum valor mágico era alta. Mas a probabilidade desse colar ter ligação com a Ametista do Sofrimento, extremamente baixa; praticamente desprezível. Entretanto, o conhecimento disso não parecia abalar a confiança do bardo.
As horas se arrastavam à medida que as taças, copos e canecas eram reabastecidas com os mais variados líquidos. A conversa do grupo ficava cada vez mais animada, planos de um futuro que não parecia assim tão distante. Por fim, Didier, já com os olhos vermelhos e semi-cerrados, subiu às escadas que levavam ao segundo andar portando uma chave. Locais como aquele eram raros, locais onde se podia beber fazendo muito barulho e ainda alugar um quarto, sem sair do estabelecimento. Instantes depois que o elfo sumira no segundo andar, Sarah levantou-se e também foi. Lya e Mahatan aproximavam-se dos outros cinco; era hora da abordagem.
— Com sua licença senhores. – uma voz cativante e melodiosa. Pigarros, copos pousando no balcão e os olhos estavam agora sobre Mahatan, alguns deslizando discretamente para as formas sinuosas da mulher ao seu lado. — Não pudemos deixar de notar os grandes feitos que comentavam entre si, portanto me pergunto se não aceitariam se juntar a um humilde bardo contador de histórias, tendo como companhia também uma valorosa guerreira.
— Mas isso é ót... – Olecram exclamava, quase pulando do banco, mas a voz comedida de Maglor cortou-o.
— Qual seu nome, bardo?
— Mahatan Palantir, meu senhor. E jovem ao meu lado é Lya Whisper. – ambos fizeram uma mesura calculadamente exagerada. Maglor deu de ombros e voltou a se concentrar na bebida à sua frente.
Em minutos, apresentaram-se, trocaram cumprimentos e foram se sentar à mesa que anteriormente o trio ocupara. Durotar e Olecram escutavam atenciosamente cada pedaço das histórias do bardo, enquanto Bruce mantinha uma conversa animada sobre batalhas sanguinárias com Lya. Alheios a tudo aquilo, trocando olhares desconfiados, estavam Lemmy e Maglor.
— E assim, pensando que se tratava da maldita megera que lhe arrancara o único e verdadeiro amor que tivera até ali, o homem assassinou a própria mãe com dois pedaços de chumbo no coração. – o bardo terminava o relato com um rosto sério, dando um gole em seu copo de gim. Instantes depois, sorriu, quebrando o silêncio com uma voz divertida. — Senhores, receio que com essa acabei todas as histórias que tinha para essa noite. – o rosto foi tornando-se triste à medida que o copo secava. A isca fora lançada. Mahatan já estava de pé quando Olecram mordeu-a.
— Espere aí, Palantir! – atenções fixadas no mago. Mesmo Bruce parara sua conversa com a guerreira para ver o que Olecram teria a dizer. — Posso te contar uma das nossas histórias mais recentes e incríveis! Assim você poderia transformá-la em uma música. – o mago foi praticamente fulminado pelos olhos dos companheiros de grupo, exceto pelo bárbaro que, maravilhado com os relatos que acabara de ouvir, não via mal em compartilhar de aventuras vividas com o bardo, da mesma forma que ele acabara de fazer.
— Está louco. Completa e irremediavelmente insano. – era Lemmy, falando baixo, mas alto o suficiente para que fosse ouvido por todos. Ao seu lado, Maglor apenas balançava negativamente a cabeça, fitando o mago.
— Fale isso agora, Killmister. Só não venha me agradecer quando escutar uma bela balada cantando seu nome!
— Para mim chega – e saiu bufando, pagando por uma chave ao taverneiro e rumando ao segundo andar. Com um último olhar de repreensão a Olecram, Maglor foi junto.
***
Antes.
Didier tentava encaixar a chave prata no buraco da fechadura do quarto número vinte, quando algo macio tocou-lhe o ombro esquerdo. Sobressaltado, o elfo virou para ver do que se tratava e então sorriu. Era uma bela garota que seus olhos haviam dado a sorte de observar quando entrara na taverna, pensara em ir até a mesa falar com ela no momento, mas o vinho acabaria por roubar toda sua atenção.
— Precisa de ajuda, senhor? – já naturalmente abobalhado por belas presenças femininas, ébrio como estava o elfo demorou mais que o costumeiro para responder àquela voz doce que o chamava. Em um primeiro momento, apenas balbuciou coisas sem sentido, as palavras fugindo-lhe da boca. Por fim, conseguiu se expressar, a voz arrastada, alterada pela bebida.
— Herm... Não. Quer dizer, sim. Na verdade, mais ou menos. Como se chama? – a moça sorriu e se aproximou, carinhosamente pegando-lhe a chave das mãos e, enquanto abria o quarto, respondeu.
— Sarah. – demorou um instante de nada e então. — MoonLight. E você, bobinho? – discretamente, tirou a chave e guardou-a atrás do cinto.
— Didier. Você é muito bonita Sarah. – entrou cambaleando pela porta aberta. — Tão bonita que perto de você eu sinto a terra girar. – teria caído, se não fossem aquelas mãos aveludadas segurarem-lhe pelos ombros, firmando-o. Silenciosamente, Sarah fechou a porta com um dos pés e foi conduzindo o rapaz bêbado para a cama de feno.
— Didier, você não está nada bem, precisa de um chá de ervas. – sempre escoltado pela garota, o elfo sentou na cama e em seguida desabou nela de costas, com a barriga para cima, sentindo as pálpebras ficarem mais e mais pesadas.
— Troco o chá por uma boa companhia. – sorriu e, por um mísero segundo, pareceu lúcido.
— Eu posso ser sua dama de companhia, Didier. Mas você precisa me ajudar. – sentara em um banco ao lado da cama e agora passava a mão esquerda pela testa do elfo enquanto a direita abria-lhe a túnica.
— Qualquer coisa. – os olhos fitavam a garota ao seu lado com uma expressão vazia, a boca pendia ligeiramente aberta enquanto o elfo tentava acariciar a mão de Sarah que agora lhe abria as amarras do colete de couro.
— Você comentou com seus amigos sobre um colar. Onde ele está? – a voz da garota era baixa e sedutora, quase um sussurro.
— Colar... O colar? Ah. Maglor fica com o colar. Só porque ele enfiou a adaga no lich, se acha no direito de guardar a jóia e não deixar ninguém vê-la. Até parece que alguém não sabe que ele guarda naquela estúpida mochila mágica. – a voz embargada ia adquirindo um tom de raiva, fazendo Didier tropeçar nas palavras, o rosto vermelho. Sarah franziu as sobrancelhas por um instante, logo voltando à expressão de ternura.
— Maglor? É o de cabelos cinza? – desamarrara os nós das pontas da armadura, soltando-a e deixando Didier mais confortável.
— Sim. Maglor, O Mesquinho. Divide sempre o quarto com alguém para economizar ouro. – virou o rosto, os olhos mais uma vez encontrando os de Sarah. — Você é muito bonita. – a garota sorriu, já sentindo o coração bater mais forte no peito, não pelos elogios vazios de Didier, mas pelo que dissera antes. O homem de cabelos grisalhos certamente não estaria embriagado e certamente não iria gostar nada de ver uma estranha no quarto de um de seus companheiros.
— Muito obrigada, meu amor. – uma ênfase descontraída foi dada nas últimas palavras enquanto a garota colocava uma das mãos na face do elfo, aproximando seus lábios dos dele, dando um selinho rápido. — Agora trate de descansar. – e como obedecendo a uma ordem, Didier fechou os olhos e dormiu, dormiu com um sorriso nos lábios.
Já para Sarah, as coisas não estavam tão bem assim. Odiava fazer o papel de puta carinhosa para conseguir informações. Na próxima vez, ela quem ficaria junto de Mahatan, conversando, enquanto Lya viria seduzir o bêbado. Não bastasse isso, ela ainda corria o risco de ser pega em flagrante. Fazendo uma prece a Lena para que isso não acontecesse, a garota colocou a chave do lado de dentro da porta, abriu-a e saiu para o corredor, suspirando profundamente ao ver que estava deserto, fechando a porta atrás de si. Uma mão no peito, controlando a respiração. Um minuto depois, empertigou-se e foi até seu quarto, ansiosa por uma merecida noite de sono.
***
Mesmo após a garota de cabelos negros bater a porta do quarto vinte e oito, esperou um bom tempo nas sombras do corredor, projetadas por alguns lampiões, pensando. Se o quarto do qual a garota saíra fosse de Didier, era hora de começar a se preocupar. Maglor Anarion abandonou seu esconderijo e foi até a porta com o número vinte talhado na madeira, abrindo-a apenas o suficiente para espreitar seu interior. Lá, deitado na cama sem nem mesmo tirar as botas, estava Didier Felgund.
— Merda. – exclamou baixinho, sem entusiasmo, enquanto fechava a porta e ficava com as costas apoiadas nela, em uma posição similar a que aquela garota estivera há pouco. Aquilo não fazia sentido algum, e por isso mesmo era ainda mais perigoso. Logo cedo, avisaria o grupo do que vira, mas antes, precisava de descanso.
***
Na manhã seguinte, ao acordar viu que já estava sozinho no quarto. Pulou de seu lado da cama e em segundos já estava pronto. Saiu do quarto vinte colocando a mochila nas costas e, no caminho para o andar de baixo, encontrou Lemmy. Desceram juntos, encontrando os outros quatro já prontos para viagem, próximos a porta. Aproximaram-se.
— Rapazes... Eu preciso... – Maglor começou, voz sempre séria e cara mais fechada que o comum. Mesmo assim, acabou atravessado.
— Prontos para partir? – era Lemmy, vendo que todos já estavam com mochilas às costas.
— Ainda não. – respondeu o mago e um alarme gritou dentro de Maglor. Aquele alarme que soava sempre que algo estava errado, sempre que alguém era suspeito ou sempre que alguém mentia. Engoliu em seco, torcendo para não ouvir aquilo que já sabia que Olecram diria. — Estamos esperando Mahatan e suas duas amigas. Eles irão conosco. – e o mago sorriu. Na verdade, ninguém mais a não ser Lemmy e Maglor pareciam ter problemas com aquilo. Mesmo Bruce, o intolerante minotauro, não fizera objeções.
— Você está brincando?! – Lemmy, indignado. Olecram apenas fez que não com a cabeça e logo apontou algo às costas do guerreiro.
— Aí vêm eles. Vamos caras, agora teremos nossas próprias canções, além de duas excelentes companhias femininas! – o guerreiro bufou, ele e Maglor olhando para trás. À frente vinha Mahatan, vestes vermelhas com detalhes em dourado e um chapéu com uma pena espalhafatosa na cabeça, atrás vinha Lya Whisper com sua beleza selvagem e, por último, a garota misteriosa que vira saindo do quarto onde dormira. Atrás de si, Didier murmurou sonhador:
— Sarah.
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009
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muito boa tbm vei...
ResponderExcluircontinue assim