Mantendo um certo vínculo com o
tema abordado no último (e primeiro) post de “Uma Máquina chamada Hard Rock”, venho agora
falar sobre o filme quentinho, recém-saído do forno, que coloca, mais uma vez,
um pouco dos anos oitenta de volta ao mainstream.
Rock Of Ages.
Para quem não sabe, o novo filme do Tom Cruise, que estreiou ontem (dia 24), é, na verdade, a
adaptação de um musical da Broadway elaborado em 2006. Portanto, já deixarei
bem claro aqui que nenhum de nós deve ser ingênuo o bastante para esperar uma
retratação crua e chocante dos excessos destrutivos da década de oitenta. Tanto
na obra original, mas, especialmente, na adaptação para a telona (“telona” é um
verbete muito engraçado, sem dúvidas), nós temos uma versãozinha água com
açúcar – e muitíssimo diluída – do rock n’roll oitentista. Isso não é
necessariamente algo ruim. O filme sabe explorar de forma cômica os clichês da
década, como as baladinhas românticas e os onipresentes isqueiros a
acompanhá-las da plateia, ou os homens-se-vestindo-feito-mulheres e
mulheres-se-vestindo-feito-prostitutas e, inclusive, as festas excessivas
envolvendo sexo, álcool, suor e vômito.
Ok, ok, ok. Então, repassando, o
problema não se constitui no fato de você ter uma versão de coração leve,
tranquila e cômica dos anos oitenta. Isso pode ate ser uma vantagem, sabe,
aquela história de deixar as coisas mais acessíveis e palatáveis ao grande
público infectado por um negocinho chamado “moral e bons costumes”. De qualquer forma, é uma sátira meiguinha (ao
contrário da sátira pesada e maravilhosamente executada por grupos feito o
Steel Panther, como comentei no post passado). O que me deixa um pouco
decepcionado, contudo, é o par romântico do filme – Julianne Hough, vivendo a louríssima e ingeníssima Sherrie, e Diego Boneta, interpretando o aspirante a
rockstar Drew. Antes deu comentar sobre as performances tão expressivas que
deixariam os bonecos da ilha de Páscoa roendo-se de inveja, pincelarei o perfil
das duas personagens:
Sherrie
vem de Tulsa, Oklahoma (Dever de casa: ouvir Girl From Oklahoma, Steel
Panther). Alimenta o sonho, assim como meio zilhão de garotas, de se tornar uma
cantora famosa em Los Angeles (a outra metade deseja ser atriz, claro). No mais
belo dos clichês (e sim, isso é realmente triste e bonito), desembarca em L.A.
com – e só para citar o grande Bret Michaels – toda sua vida empacotada em uma
mala a seus pés. (Dever de casa again: Fallen Angel, Poison e The Angel
Song, Great White).
Drew
já mora em L.A. há mais tempo e trabalha como ajudante de um bar (o fictício
The Bourbon Room e que, acredito, seja uma referência bastante espirituosa ao
Whisky A-Go-Go). Possui uma bandinha correndo em paralelo e almeja se tornar o
próximo Stacee Jaxx, o Rock God do espetáculo.
É
como se dois personagens da Disney houvessem se intrometido no filme errado e
estivessem lá, perdidos, vagando feito dois songa-mongas pelo caos de neon da
Sunset Strip. Eu esperava o tempo todo pelo instante em que alguém começasse a
cantar What time is it? Summertime! e,
BAM!, O resto do elenco de High School Music aparecesse na esquina seguinte.
Claro que isso não aconteceu, mas ver o ex-RBD do Diego Boneta empunhando uma
guitarra mais ou menos igual aquela sua Tia Gertrudes faria é triste e beira o
humor involuntário. Talvez seja o seu rostinho de bebê, talvez seja a falta de
um verdadeiro poodle-hair, talvez
seja apenas a sua limitada capacidade de atuar, mas o cidadão simplesmente não
convence como um aspirante a rockstar. Cabe aqui um parêntese: que merda de
bom-mocismo, hein? Em 1987, um vocalista e frontman de uma banda pequena de
rock que não bebe, não fuma e o máximo de interjeição que deixa sua boca é “Jesus!”?
Seems legit - but no. De forma geral, a impressão que me fica é que faltou
caráter e personalidade tanto ao personagem Drew como ao ator Diego. Nunca vi
um rockeiro tão decepcionantemente sem sal, sem aquele ar provocativo de
encrenca, sem estilo. Talvez em “Camp
Rock” ele se encaixasse melhor.
Passemos
agora à heroína, Sherrie. Não irei malhá-la da forma que fiz com o sujeito aí
em cima, especialmente por acreditar que o rostinho bonito, a inocência e a
falta de tempero sejam mais fáceis de deglutir como atributos da personagem de
Julianne Hough (recém-contratada pela série SMASH, aliás). Mas, resumidamente,
acredito que ela peca nos mesmos aspectos que seu par: personalidade e caráter.
Mesmo quando a senhorita (SPOILER ALERT SPOILER ALERT SPOILER ALERT) começa a
trabalhar em uma strip club e promete, cantando, que irá “endurecer seu coração”,
a única coisa que vemos é a mesma loura bonitinha e besta, incapaz de fazer
nada a não ser chorar na chuva e servir mesas.
Ou
seja, os pontos que me irritam nesse par romântico se encontram em uma espécie
de área cinza entre personagens e atores. E como poderia ter sido melhor?
Colocar o ótimo Russell Brand para interpretar Drew, talvez? Talvez! Mas isso
acabaria com a pureza de espírito e coração do romance, destruiria a versão
doce de um amor oitentista que o musical passa. Mesmo fazer Diego e Julianne
usarem cabelões armados deixaria a sátira um pouco menos meiguinha e,
consequentemente, menos comercial. Por que queeeeem iria beijar um homem com um
cabeeeeelo horríííível daqueeeeeles?
More than woooords is all you haaave to dooo...
Agora,
passemos às menções honrosas.
Como
eu sou um sujeito pouco exigente no que diz respeito a filmes (mesmo o Vin
Diesel e sua eterna franquia de Fast & Furious são capazes de me alegrar),
digo que gostei de quase todo o resto (REPITO: tendo em mente, sempre em mente,
que devemos esperar algo açucarado, algo light, capiche?). As atuações de Alec
Baldwin, Catherine Zeta-Jones e Paul Giamatti são soberbas. Isso para não falar
do Russell Brand que, na pele de Lonnie, melhor amigo de Dennis Dupree, o dono
do Bourbon Room, nos brinda com maravilhosos episódios cômicos. Brand, pela sua
própria história de vida, quem sabe, seja o membro do elenco com maior
potencial para encarnar, propriamente, o espírito auto-destrutivo e hedonista
dos anos oitenta e, de alguma forma, é possível sentir o quanto ele se divertia
gravando cada uma daquelas cenas. Mas e quanto ao glorioso Stacee Jaxx? Ok, um
minuto porque isso precisa de um parágrafo novo.
Dennis Dupree (Alec Baldwin) e Lonnie (Russell Brand)
Pronto.
Bem, assim que Tom Cruise foi escolhido para viver o papel do deus do rock (of
ages), houve um monte de críticos e gente falando merda, questionando a escolha
principalmente pelas até então desconhecidas e misteriosas capacidades
vocálicas do ícone de Hollywood. Besteira. Assista ao filme e você perceberá as
maravilhas que cinco horas de treino diário são capazes de fazer com suas
pregas vocais. Os desavisados mal reconhecerão o timbre da voz impostada de
Cruise, algo diferente e muitíssimo interessante. E as notas altas estão lá,
claro que estão. Ah, mas o estúdio e mimimi. Sim, o estúdio e mimimi ajuda,
maqueia, faz você ouvir algo que não pode existir com tamanha perfeição fora
dele. Axl Rose e um monte de ouros rockstars que o digam. No entanto, sem
dúvidas, é bem fácil perceber que, durante as performances de Cruise, falta um
pouco da força e da naturalidade que vozes como Julianne Hough ou o próprio
Diego Boneta apresentam. Só que isso só é um problema se você quiser transformá-lo
em um. Eu não quero. Eu gosto do Tom Cruise. Acho que, junto com Brad Pitt, ele
é tão questionado por ter surgido como um “rotinho bonito”. Mas, assim como o
marido da Angelina (talvez em menor escala que este, apenas), Cruise é um bom e
versátil ator. Sua personificação de Stacee Jaxx agradou-me bastante. As
excentricidades de quem está no topo, o jeito arrogante, o estilo e a pose, o
chapéu de cowboy e a bebeção ininterrupta de scotch, além de um raciocínio que
parece vir quase que o tempo todo da cabeça de baixo. Está tudo ali. E é tudo
que Diego/Drew não possui.
Tom Cruise as mothafuckin Stacee Jaxx
Por
fim, somando a parte água com açúcar com as referências um pouco mais maduras
do resto do filme, nós temos uma película que oscila entre um musical
infanto-juvenill-debiloide da Disney e algo um pouco mais desbocado, mas ainda
dentro dos limites do mainstream. Acaba não sendo um filme completamente
adequado a crianças e que, ao mesmo tempo, pode causar enfado nos mais velhos
que não estejam a fim de acompanhar o lenga-lenga quase novelesco dos dois
protagonistas. Sim, Drew e Sherrie são os protagonistas e são exatamente a
âncora que puxa o filme para baixo. Se a escolha tivesse sido a Lindsay Lohan,
talvez, a censura poderia ter sido elevada, de dez, para uns dezesseis anos.
MAS!
E A
TRILHA SONORA?
Ah,
sim, sim, claro!
Os
números do musical são todos muito bons, não há nada de muito diferente a
ressaltar. Apenas o óbvio acontece: Os grandes astros ‘pop’ do glam metal marcam presença (Bon Jovi, Def
Leppard e Poison). Até uma música do Skid Row toca como plano de fundo de uma
loja de discos dois anos antes de ser comercialmente lançada. Liberdade poética,
claro. As power ballads aparecem com força, assim como os grandes hinos do rock de
arena (Twisted Sister?! Twisted Sister!). Senti falta de alguns outros grandes
grupos como o Crüe, Cinderella, Ratt e, claro, o Kiss. Mas, otimista que sou,
considero ouvir Def Leppard e Warrant, em 2012, numa sala de cinema, motivo o
bastante para me alegrar.
Cabe
só uma ressalva aqui: a maioria dos números são mash-ups de duas ou mais
músicas e, portanto, alguns destes podem soar esquisitos. Eu, particularmente,
não gostei do que fizeram com More Than Words/Heaven. O resto, julgue-o.
Finalizando:
Eu gostei
do filme. Achei que o ingresso valeu seu preço – e olha que não sou o maior fã
de musicais, de Glee e nem de filmes infanto-juvenis da Dinsey. Contudo, se
você não gosta do rock n roll oitentista, não gosta do Tom Cruise, não gosta da
Zeta-Jones e não gosta de atores interrompendo o fluxo normal da narrativa para
começar a cantar, provavelmente Rock Of Ages não será um dos seus filmes
prediletos. No entanto, é uma boa pedida, mesmo para os fãs de uma simples e
bonitinha estória de amor.
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